Justiça garante créditos de PIS/Cofins sobre gastos com shopping virtual
Comerciantes passaram a recorrer à Justiça para
obter créditos de PIS e Cofins sobre gastos com as taxas cobradas pelos
marketplaces - plataformas on-line, como Mercado Livre, Amazon e Magazine
Luiza, que vendem produtos de terceiros. A primeira liminar que se tem notícia
foi concedida pela 22ª Vara Cível Federal de São Paulo e beneficia uma empresa
de equipamentos eletrônicos, que garante hoje 83% do faturamento por meio
desses shoppings virtuais.
Com a pandemia, muitos comerciantes não tiveram outra opção senão recorrer aos
marketplaces, que ganharam volume. Os cinco maiores do país - Mercado Livre,
Magazine Luiza, Americanas, Via Varejo e Carrefour - somaram R$ 123,9 bilhões
em vendas em 2020, 81% a mais que em 2019, segundo a Sociedade Brasileira de
Varejo e Consumo.
A tese é mais uma fundamentada na decisão do Superior Tribunal de Justiça
(STJ), em recurso repetitivo (REsp 1221170), que considera insumo e, portanto,
apto a gerar crédito, tudo que for imprescindível para o desenvolvimento da
atividade econômica. O julgamento foi realizado em 2018.
A análise deve ser feita caso a caso, por depender de provas. No caso da
empresa que comercializa equipamentos eletrônicos, o advogado Eduardo Ramos
Viçoso Silva, do Peluso, Stupp e Guaritá Advogados, alegou que, em razão da
pandemia, o faturamento do cliente, antes concentrado nas lojas físicas, migrou
para o ambiente virtual.
“No ambiente virtual de negócios, contudo, dificilmente o pequeno ou médio
player terão visibilidade em site próprio. A alternativa é socorrer-se aos
denominados marketplaces”, diz o advogado. Ele acrescenta que hoje esses
shopping centers virtuais são essenciais para os negócios dos comerciantes e,
por isso, as comissões cobradas para intermediação - em média de 10% - devem
gerar créditos de PIS e Cofins.
Ao analisar o caso, o juiz José Henrique Prescendo, da 22ª Vara Cível Federal
de São Paulo, levou em consideração que o contribuinte deixa claro no pedido
que, mesmo atuando com lojas físicas, necessita estar no sistema de marketplace
para ter visibilidade no mercado. “De modo que possui elevados custos a título
de intermediação, que conforme já asseverado, são essenciais para o regular
desenvolvimento de suas atividades”, afirma.
De acordo com o magistrado, a legislação que trata do PIS e da Cofins “trouxe
uma noção do que se deve compreender por insumo, a partir de um rol
exemplificativo, ou seja, não taxativo” e que é preciso analisar a atividade
exercida pelo contribuinte, “de maneira que o que é insumo para um contribuinte
pode não ser para outro”.
No caso, a empresa tem como objeto social a fabricação de equipamentos de
informática, o comércio de equipamentos eletrônicos e a prestação de serviços
de manutenção. Em 2020, segundo o processo, as vendas on-line, via marketplace,
corresponderam a 72% de seu faturamento.
Para o advogado Eduardo Ramos Viçoso Silva, a decisão é muito relevante
economicamente e serve de precedente para outros comerciantes “Hoje em dia esse
gasto é muito significativo. É a maior despesa que essas empresas têm, como se
fosse o aluguel das lojas físicas”, diz.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que vai recorrer da
decisão. No entendimento dos procuradores, ela está em descompasso com o
julgamento dos Temas 779 e 780, do STJ, que fixou que o conceito de insumos,
para fins de creditamento de PIS/Cofins, deve ser aferido à luz da
essencialidade.
Outros comerciantes não obtiveram liminares na Justiça Federal. Uma das decisões
desfavoráveis foi dada em processo ajuizado por um comércio de autopeças. O
caso foi analisado pela 1ª Vara Federal de Bauru (SP). O juiz federal Joaquim
Alves Pinto não considerou essenciais os gastos com marketplaces. Para ele, a
empresa “fez sua opção de negócio de forma a não se utilizar de espaços
físicos, cortando custos como aluguel, água, luz, telefone etc. E já se
beneficia com isso” (processo nº 5001921-83.2020.4.03.6111).
O outro caso envolve um comércio eletrônico de móveis em madeira. O pedido foi
negado pela 2ª Vara Federal de Curitiba (processo nº
5037757-76.2019.4.04.7000). O juiz Joaquim Euripedes Alves Pinto destaca na
decisão que o próprio objeto social da empresa diz que trata-se de comércio
varejista por meio eletrônico, o que faz com que esses gastos sejam
caracterizados como custos operacionais e não como insumos.
Leonardo Mazzillo, do W Faria Advogados, porém, considera correto o
entendimento da 22ª Vara Cível Federal de São Paulo, que deu direito ao
crédito. “A decisão supera definitivamente a posição equivocada da Receita
Federal de que o conceito de insumos não se aplica a atividades comerciais”,
diz ele. “Com exceção das grandes redes, quem quer vender produtos hoje pela
internet depende necessariamente de um marketplace.”
Ao analisar a “essencialidade”, o advogado Rafael Fabiano, do Leonardo Naves
Direito, ressalta que não é mais possível pensar em um mundo sem vendas pela
internet. “Todas as despesas que viabilizam a venda por esse canal tornam-se,
invariavelmente, essenciais e relevantes, eis que sem aquelas, a venda virtual
não seria possível e, consequentemente, parte substancial da receita não se
realizaria”, afirma.
Procurada pelo Valor, a Amazon não quis se manifestar sobre o assunto. Os
demais marketplaces não deram retorno até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico