A Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Ficais
(Carf) do Ministério da Fazenda deve julgar nesta quarta-feira (29/1) dois
recursos da Fazenda Nacional contra a indústria de aço Gerdau em casos que
envolvem o uso de ágio interno para redução de tributos. Os casos abrem o ano
das sessões da mais alta instância do Carf.
Entre 2005 e 2010, a Gerdau fez operações de reorganização
societária que envolveram subscrição de capital, incorporação e cisão. Essas
operações geraram ágio que teve reflexos na apuração do Imposto de Renda e da
Contribuição Social sobre Lucro Líquido. O Fisco autuou a empresa alegando que
deduções com ágio interno são ilegais e que ocorreu um planejamento tributário
abusivo.
A Gerdau impugnou as autuações para demonstrar que a dedução é
legal e só passará a ser vedada obrigatoriamente em 2015 — o que decorre da
Medida Provisória 627, publicada em 2013. Segundo os recursos da empresa, a
alteração societária questionada pela Receita consistiu numa operação de
reorganização regular dentro do mesmo grupo visando aumento da produtividade,
com verdadeiro "propósito negocial" — conceito usado frequentemente
pelo Fisco para classificar como indevidas operações que visem exclusivamente
diminuir a tributação.
A 1ª Turma da Delegacia da Receita Federal de Julgamento de
Porto Alegre julgou improcedentes as impugnações da indústria em relação aos
lançamentos formalizados em 2010, exigindo créditos tributários nos valores de
R$ 722 milhões e R$ 182 milhões.
A Gerdau recorreu e, em 2012, a 1ª Turma Ordinária da 1ª Câmara
da 1ª Seção do Carf entendeu que as operações do grupo foram lícitas.
Segundo o conselheiro Carlos Eduardo de Almeida Guerreiro, autor do voto
vencedor, não existe nenhuma restrição na legislação fiscal quanto a operações
dentro de um mesmo grupo. "A alegação de que operações dentro do grupo não
têm fundamento econômico viola a lei", afirmou em seu voto.
“Em Direito Tributário, não existe o menor problema em a pessoa
agir para reduzir sua carga tributária, desde que atue por meios lícitos.
Inclusive, é de se esperar que as pessoas façam isso, sendo recriminável
exatamente a conduta oposta. A grande infração em tributação é agir
intencionalmente para esconder do credor os fatos tributáveis (sonegação), mas
isso não ocorreu no caso concreto”, explicou nas decisões.
Amortização de ágio
A Lei 9.532, de 1997, permitiu que o ágio gerado na compra de empresas —
formado pela fração do valor pago referente à rentabilidade futura do negócio
adquirido — fosse deduzido parceladamente da base de cálculo do IRPJ e da CSLL.
Porém, para a Receita, se a operação ocorre sem motivo negocial suficiente e
apenas para gerar economia tributária, o ágio é indevido.
Em um dos recursos da Gerdau, por exemplo, a Fazenda defendeu
que “o ágio gerado em operações societárias, para ser eficaz perante o Fisco,
deve decorrer de atos efetivamente existentes, e não apenas artificial e
formalmente revelados em documentação ou na escrituração mercantil ou fiscal”.
O Fisco enquadra como "artificial" o chamado
"ágio interno", gerado em operações de fusão e aquisição de empresas
que já têm vínculos ou fazem parte de um mesmo conglomerado.
Entretanto, de acordo com a tributarista Mary Elbe Queiroz,
consultora da FocoFiscal Cursos e Capacitação, a dedução do ágio interno só foi
proibida com a edição da MP 627. Sendo assim, de acordo com ela, quando a
Gerdau fez as operações de reoganização societária, não existia nenhuma lei que
vedasse a dedução. “O que a empresa fez estava de acordo com a lei vigente à
época da operação”, opina. Ou seja, a operação estaria protegida pelo direito
adquirito e pela irretroatividade da nova MP.
A Medida Provisória 627 mudou toda a estrutura da
apuração dos impostos e criou a vedação da dedução do ágio interno a partir de
2015. As empresas podem optar por adotar os precedimentos da MP ainda este ano.
Mas para elas, a vedação do ágio interno já começa a contar.
Pela norma, nas aquisições e reorganizações societárias, só vai
ser aceito como dedutível, para amortização do IRPJ e da CSLL, o ágio gerado
entre empresas independentes.
LIvia Scocuglia é repórter da revista Consultor Jurídico.
Fonte: Revista Consultor Jurídico