Por Bárbara Pombo | De Brasília
Empresas como Nestlé, Fibria, Veracel,
Philips e Sodexo conseguiram recentemente nos Tribunais Regionais Federais
(TRFs) decisões que as liberam de reter o Imposto de Renda (IR) na fonte sobre
os valores remetidos ao exterior para pagar prestadores de serviço que não
possuem representação no Brasil. A questão, discutida há mais de dez anos por
contribuintes e Receita Federal, é milionária. Segundo advogados, as decisões
indicam uma mudança de entendimento dos tribunais após a primeira manifestação
do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o assunto. “Até o STJ virar o jogo,
a maioria dos tribunais era favorável à tese do Fisco, especialmente os da 1ª e
3ª regiões”, diz o tributarista Alexandre Siciliano Borges, do Lobo & de Rizzo
Advogados. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), responsável pela
defesa da Receita Federal, tem recorrido dos casos. O julgamento da Corte, de
acordo com advogados, também já alterou a postura das empresas em relação à
exigência do tributo. “Com a sinalização do STJ, as companhias que recolhiam o
imposto optaram por entrar com ações preventivas na Justiça para evitar novas
cobranças e recuperar os valores já pagos”, afirma Leonardo Augusto Andrade, do
escritório Velloza & Girotto Advogados Associados, responsável pelo caso da
Copesul – Companhia Petroquímica do Sul, julgado em maio de 2012 pelo STJ e
encerrado em agosto. A empresa havia firmado contratos de assistência técnica
com prestadores de serviços do Canadá e da Alemanha. Para os cinco ministros da
2ª Turma do STJ, a exigência do IR sobre as remessas é indevida. Os ministros
consideraram o fato de o Brasil possuir tratados com 29 países para evitar a
bitributação. Pelos acordos, o IR só seria retido no país-sede da empresa
prestadora dos serviços. Os ministros pontuaram ainda que as companhias
estrangeiras, por não possuírem estabelecimento fixo no Brasil, não apuram o IR
aqui porque não há despesas e exclusões para auferir o lucro. O STJ deverá
julgar em breve os casos da Iberdrola e da Shell, que contratam serviços da
Espanha e da Holanda, respectivamente. A legislação do Imposto de Renda (Lei nº
9.779, de 1999) determina a aplicação da alíquota de 25% sobre a “prestação de
serviços pagos ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior”. A partir
do Ato Declaratório Normativa nº 1, de 2000, a Receita Federal interpretou que
o imposto deve ser pago sobre os rendimentos gerados pelos contratos de
prestação de assistência e serviços técnicos sem transferência de tecnologia.
Na mesma norma, o Fisco sustenta que essas receitas não são classificadas como
lucro, mas sim como “rendimentos não expressamente mencionados” que, segundo os
acordos de bitributação, sofrem a incidência do IR nos dois países. No dia 6, a
maioria dos desembargadores da 3ª Turma do TRF da 2ª Região (Rio de Janeiro e
Espírito Santo), porém, liberaram a Fibria de reter o imposto sobre as remessas
enviadas para uma companhia da Finlândia. “Além de citar o precedente do STJ,
os desembargadores entenderam que as remessas não são rendimentos operacionais,
mas lucro da empresa estrangeira”, diz o advogado Francisco Giardina, do
Bichara, Barata & Costa Advogados, responsável pela defesa da produtora de
celulose. A jurisprudência do tribunal, no entanto, ainda não é totalmente
favorável aos contribuintes. Em fevereiro, a 4ª Turma permitiu que a Receita
cobre o imposto de uma empresa de telecomunicações que havia contratado
serviços da França. A maioria dos desembargadores considerou que os pagamentos
não são lucro da empresa estrangeira, mas apenas uma parte desse lucro, que,
segundo os tratados internacionais, são tributáveis. No TRF da 1ª Região, com
sede em Brasília, a Veracel Celulose ganhou a causa em um julgamento encerrado
em julho. A empresa havia contratado os serviços de uma companhia do Japão para
implantar uma fábrica em Eunápolis, no sul da Bahia. A decisão da 7ª Turma,
porém, não foi unânime. Para o relator, desembargador Luciano Tolentino, as
verbas são receitas operacionais e, por isso, tributáveis. Os desembargadores
Reynaldo Fonseca e o juiz convocado Rodrigo de Godoy Mendes citaram o
precedente do STJ para discordar. “A Convenção Nipo-Brasileiro deve prevalecer
sobre a legislação interna, não sendo o caso de tratar os pagamentos como
rendimentos tributáveis”, disse Fonseca no acórdão. No TRF da 3ª Região (São
Paulo e Mato Grosso do Sul), grandes empresas como a Philips Medical Systems, a
Nestlé e a Sodexo também obtiveram decisões favoráveis para dispensar o IR
sobre remessas à Holanda, Canadá e França, respectivamente. Os desembargadores
entenderam que a blindagem dos tratados contra a tributação dos lucros da
empresa estrangeira “abrange os rendimentos auferidos em razão dos serviços
prestados à empresa brasileira”. Procuradas pelo Valor, a Nestlé Brasil e a Sodexo
preferiram não comentar o assunto. A Philips Medical Systems, a Fibria, a
Veracel e a PGFN não responderam até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico