Maiores discussões tributárias valem R$ 350 bi para a União
As seis maiores discussões tributárias da União
na Justiça estão estimadas em R$ 350 bilhões, segundo o relatório Riscos
Fiscais, anexado ao Orçamento de 2016. O valor supera, por exemplo, todas as
despesas com pessoal do governo federal (R$ 277 bilhões) e do Bolsa Família (R$
28 bilhões).
Os tributaristas alertam que a maior parte dessas discussões entre fisco e
contribuintes depende de uma posição do Supremo Tribunal Federal (STF). É o que
ocorre com o mais representativo dos casos, estimado pela União em R$ 250
bilhões. O debate é se o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS) faz parte ou não do faturamento da empresa, que é a base de cálculo do
PIS/Cofins.
Para o tributarista e sócio do Andrade Maia Advogados, Fábio Brun Goldschmidt,
não há dúvida de que a inclusão é indevida. "Incluir o ICMS na base de
cálculo das contribuições é inconstitucional, pois faz incidir tributos sobre
um dispêndio, um ônus, que é justamente o oposto do conceito de
faturamento", explica ele.
Apesar de o assunto ter chegado ao Supremo quase 18 anos atrás, só em 2014 foi
julgado um recurso extraordinário sobre o tema, destaca sócio do Souto Correa,
Henry Lummertz. De acordo com ele, o resultado foi favorável ao contribuinte,
por sete votos a dois, mas os efeitos do julgamento foram limitados pelos
ministros do STF.
"Como esse julgamento se estendeu por muitos anos e vários dos
ministros que votaram não estão mais no tribunal, o STF manifestou-se
expressamente no sentido de que a decisão não constituía um precedente",
explica o especialista. A Corte Suprema já selecionou novos casos que
representam a controvérsia sobre o tema. São eles o Recurso Extraordinário nº
574.706 e a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 18. Os ministros
do STF ainda não começaram a julgar esses casos em plenário.
Para Lummertz, apesar da vitória dos contribuintes na primeira ocasião, ainda
não é possível antecipar qual será a decisão final do STF sobre o assunto. Dos
ministros sete ministros que votaram a favor dos contribuintes no primeiro
caso, quatro permanecem no tribunal. Para conseguir a maioria, os contribuintes
precisam de pelo menos seis dos onze votos.
Como o Supremo tem demorado para chegar a uma conclusão sobre o conceito de
faturamento no debate sobre a base de cálculo do PIS/Cofins, o Superior
Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar a questão. Goldschmidt aponta que,
no ano passado, foram vistos avanços nesse sentido. Em março de 2015, a
primeira turma proferiu uma decisão favorável aos contribuintes num agravo ao
Recursos Especiais (REsp) 593.627. A base para a decisão foi o posicionamento
provisório do STF.
Já na segunda turma, as decisões eram desfavoráveis. Para solucionar a
controvérsia no STJ, a tese foi submetida à 1ª Seção no REsp nº 1.500.473, que
reúne as duas turmas do tribunal. Nesse caso, houve dois fotos favoráveis aos
contribuintes e um pela impossibilidade do julgamento da questão. O caso pode
voltar ao plenário da 1ª Seção do STJ a qualquer momento.
Serviços
Lummertz destaca que a solução do caso sobre o ICMS no PIS/Cofins deve também
orientar o desfecho de um outro debate muito parecido, que trata da inclusão do
Imposto sobre Serviços (ISS) na base de cálculo dos tributos federais. Mas nas
estimativas da União, esse segundo caso vale bem menos que o primeiro: R$ 3,9
bilhões. Essa tese, explica o advogado, afeta todas as empresas prestadoras de
serviços e sujeitas ao pagamento do ISS.
O tributarista do Souto Correa ainda destaca que o debate sobre o ISS já foi ao
STJ. Em junho do ano passado, a 1ª Seção afirmou que o tributo deve sim ser
incluído na base de cálculo do PIS/Cofins. O acórdão dessa decisão, contudo,
ainda não está disponível. Além disso, o contribuinte deve recorrer.
Mas para Lummertz, esse debate pertence mesmo ao STF. "A matéria é
eminentemente constitucional. A palavra final será dada mesmo pelo
Supremo", afirma o advogado.
Insumos
Outro caso estratégico para o governo federal envolve o aproveitamento de
créditos de insumos na base de cálculo do PIS/Cofins. Apesar de a Constituição
garantir a incidência não-cumulativa dos tributos federais para alguns setores
da economia, diz Goldschmidt, a indefinição do conceito de insumo tem permitido
que o fisco vede esses créditos em diversas situações, tornando, na prática,
cumulativa a tributação.
O tributarista explica, como exemplo, que no ramo de transporte de cargas os
combustíveis e lubrificantes dos veículos são considerados insumos. Por outro
lado, não se consideram insumos os seguros, os serviços de monitoramento e
rastreamento via satélite, os serviços de agenciamento de cargas, nem valores
gastos com despachantes, lavagem e desinfecção.
Esse tema está tanto no STF, no Recurso Especial 841.979, de relatoria do
ministro Luiz Fux, quanto no Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial
(REsp) 1.221.170. Lummertz destaca que no STJ o julgamento começou com o voto
do ministro relator Napoleão Nunes Maia Filho. Em seguida, o julgamento acabou
sendo interrompido por um pedido de vista.
Lummertz aponta que o relator defendeu um conceito abrangente dos insumos,
favorável aos contribuintes. Nas palavras do ministro relator, seriam
consideradas insumos "todas as despesas diretas e indiretas do
contribuinte, abrangendo, portanto, as que se referem à totalidade dos insumos,
não sendo possível, no nível da produção, separar o que é essencial do que
seria acidental".
Na visão de Lummertz, contudo, deve prevalecer no STJ um posicionamento um
pouco mais brando, possivelmente um meio termo entre o que a União e os
contribuintes querem. Ele reforça que o presidente da 1ª seção do STJ, o
ministro Herman Benjamin, indicou que o tribunal deve avaliar se manterá o caso
no rito dos recursos repetitivos, o que coloca em xeque a abrangência do
julgamento. Ainda não previsão de retorno do caso à pauta.
Previdência fechada
As entidades fechadas de previdência complementar, como Previ (do Banco do
Brasil), Petros (Petrobras) e Funcef (Caixa Econômica Federal), travam outra
discussão tributária representativa para a União. O debate é estimado pela
União em cerca de R$ 20 bilhões.
As fundos de pensão combatem a incidência de Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido (CSLL) e do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) sobre o
superávit, já que em tese seu resultado não configura lucro, conta Goldschmidt.
"O superávit de tais entidades não é lucro e sequer pode ser distribuído,
devendo ser integralmente reinvestido para cumprir de seus objetivos
sociais", afirma.
O sócio do Souto Correa, André Gomes, conta que a Associação Brasileira das
Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp) buscou, via mandado de
segurança, garantir a não incidência de CSLL e do IR, sob fundamento de
"serem proibidas de perseguir o lucro, não poderia haver o fato gerador
desses tributos".
Gomes aponta que existem dois casos sobre o tema no STJ. Na primeira turma,
trata-se do REsp n° 1.099.593, e na segunda, do REsp n° 1.419.370. "As
decisões proferidas até o momento foram desfavoráveis ao contribuinte, mas
ainda é imprevisível o posicionamento do STJ - e do STF - acerca das
matérias", explica o tributarista. Goldschmidt aponta que Supremo já
reconheceu a repercussão geral da tese no RE 612.686, de relatoria do Ministro
Luiz Fux. A análise do caso está pendente.
Roberto Dumke
Fonte: DCI