STF tem maioria para anular decisão definitiva em mudanças erga omnes
O Supremo Tribunal Federal formou maioria nesta segunda-feira
(21/11) em um dos julgamentos que estão ocorrendo em Plenário Virtual
para definir se a mudança de jurisprudência da Corte em temas
tributários gera a quebra automática do trânsito em julgado de casos anteriores
decididos em sentido contrário.
Decisão do Supremo terá influência sobre todos os processos
tributários do país
O caso que já tem maioria (RE 949.297), de relatoria do ministro
Luiz Edson Fachin, aborda o que acontece com a decisão tributária transitada em
julgado quando o STF declarar que um tributo originalmente considerado ilegal
é, na verdade, constitucional — em decisão com efeito erga omnes,
que vale para todos, e, portanto, no controle concentrado de
constitucionalidade.
Até agora, sete ministros foram a favor de admitir a quebra do trânsito em julgado
da decisão nessas hipóteses: o próprio relator, Luís Roberto Barroso,
Rosa Weber, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Dias Toffoli.
Na prática, isso
significa que não é mais preciso entrar com uma ação rescisória para que o novo
entendimento do STF sobre a aplicabilidade do tributo seja implantada.
Em conjunto está sendo julgado um outro recurso (RE
955.227), de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, que discute o que
acontece com a decisão tributária definitiva quando o STF, em um novo acórdão,
se pronuncia em sentido contrário — em decisões individuais, que não dizem
respeito a mais ninguém além das partes; ou seja, no âmbito do controle difuso
de constitucionalidade. Neste julgamento, ainda há apenas cinco votos
depositados.
Como mostrou a ConJur,
os julgamentos são muito aguardados devido aos amplos impactos na
segurança jurídica e na forma de atuação do Fisco perante os contribuintes.
Advogados ouvidos pelo Valor Econômico apontam que a decisão vai afetar pelo
menos quatro teses fundamentais, com enorme impacto para o contribuinte: as
relativas à cobrança de CSLL, de IPI, contribuição patronal sobre terço de
férias e Cofins de sociedades uniprofissionais.
Segundo o tributarista Hugo de Brito Machado
Segundo, em coluna publicada na ConJur,
o RE que já tem maioria era, dos dois, aquele sobre o qual havia menos
discordância. Entende-se, "de modo razoavelmente pacífico", que,
quando a decisão tem efeito erga omnes, alcançando pessoas além
das partes do processo (em ADI, ADC ou RE com repercussão geral), uma mudança
de entendimento equivale a mudança na legislação. Assim, os efeitos da decisão
transitada em julgada devem ser interrompidos de imediato, tão logo a nova
decisão passe a valer.
"Tem-se hipótese análoga à da sentença que afirma indevido
um tributo, por falta de amparo legal, e em seguida o Poder Público edita uma
lei conferindo esse amparo. A partir da lei, o tributo se faz devido, e, a
sentença deixa de afastar sua cobrança, porque desaparece seu fundamento
(a falta de lei)", explica.
Caso a caso
O problema, para Machado Segundo, é em relação às decisões sem efeitos
vinculantes. Nesses casos, estudiosos e tributaristas concordam que o Supremo
deveria prestigiar a coisa julgada e não admitir sua quebra sem interposição de
ação revisional. Apesar disso, os cinco ministros que já votaram foram a favor da quebra automática
nesses casos também.
Segundo o voto do ministro Barroso, relator, a manutenção da
coisa julgada em matéria tributária após o posicionamento do STF em sentido
contrário cria uma situação desigual: algumas empresas não precisarão recolher
a CSLL, ganhando vantagem competitiva e financeira em relação às demais, o que
as permitirá baratear os custos de sua estrutura e produção.
"A coisa julgada não pode servir como salvo conduto
inalterável a fim de ser oponível eternamente pelo jurisdicionado somente
porque lhe é favorável", afirmou.
"Alterado o contexto fático e jurídico, com o
pronunciamento desta Corte em repercussão geral ou em controle concentrado, os
efeitos das sentenças transitadas em julgado em relações de trato sucessivo
devem a ele se adaptar", disse.
Gilmar Mendes mudou
entendimento após pedido de vista e passou a acompanhar os relatores com
ressalvas
As novidades
O julgamento dos dois recursos foi retomado na sexta-feira (18/11) com
voto-vista do ministro Gilmar Mendes, que a princípio tinha se posicionado contra a quebra da coisa julgada
tributária, mas mudou de entendimento.
Agora, o ministro Gilmar Mendes apresentou uma divergência
parcial, baseada na proposta de modulação dos efeitos da tese a ser aprovada
pelo STF.
Tanto o ministro Barroso quanto o ministro Fachin ressaltaram
que, quando o Supremo declara a constitucionalidade de uma lei que cria um
tributo, produz para o contribuinte uma norma jurídica nova.
E para isso, o ordenamento prevê algumas regras: a cobrança não
pode retroagir para período em que o tributo não existia, e é preciso dar um
tempo de transição, para que o contribuinte não seja pego de surpresa.
Assim, a proposta é que a tese só valha a partir da publicação
da ata de julgamento e leve em conta o período de anterioridade nonagesimal,
para os casos de contribuições sociais, e de anterioridade anual e noventena,
para as demais espécies tributárias.
O ministro Gilmar Mendes divergiu especificamente nesse último
ponto. Ele entendeu ser desnecessária a aplicação dos princípios da
anterioridade anual e da noventena.
Teses
No RE 949.297, a tese proposta pelo ministro Luiz Edson Fachin foi:
A eficácia temporal de coisa julgada material derivada
de relação tributária de trato continuado possui condição resolutiva que
se implementa com a publicação de ata de ulterior julgamento realizado em
sede de controle abstrato e concentrado de constitucionalidade pelo
Supremo Tribunal Federal, quando os comandos decisionais sejam opostos,
observadas as regras constitucionais da irretroatividade, a anterioridade
anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, de acordo com a
espécie tributária em questão
No RE 955.227, o ministro Luís Roberto Barroso propôs duas
teses:
As decisões do STF em controle incidental de
constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão
geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado,
mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo.
Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de
repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das
sentenças transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a
irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade
nonagesimal, conforme a natureza do tributo.
Entenda o caso
Os dois REs tratam da cobrança da Contribuição Social sobre Lucro Líquido
(CSLL), tributo instituído pela Lei 7.689/1988 e cuja incidência foi
inicialmente afastada por decisões judiciais sob o fundamento de que só poderia
ser criado e por meio de lei complementar.
A partir de 1992, o STF passou a proferir decisões individuais
declarando a constitucionalidade da CSLL. Mas foi apenas a partir de 2007, após
a instauração da sistemática da repercussão geral, que o Supremo julgou o tema
com eficácia erga omnes (para todos), na ADI 15, confirmando
essa posição.
A União passou a entender que todos deveriam pagar a
contribuição, inclusive aqueles que já tinham decisão transitada em julgado
afastando a incidência do tributo. Já os contribuintes defenderam a prevalência
da coisa julgada.
Fonte: Conjur