Nova legislação facilita negociação de débitos com a Fazenda Nacional
Contribuintes e a Fazenda Nacional terão mais chances de
fechar acordos por meio das transações tributárias. Publicada ontem, a Lei nº
14.375 amplia descontos e prazos de pagamento. Ainda permite a negociação de
todas as dívidas discutidas na esfera administrativa - hoje existem restrições
em relação a débitos com a Receita Federal.
A nova norma traz também um ponto particularmente
importante, que deve atrair empresas em dificuldade financeira: a possibilidade
de abater dívidas com o Fisco usando valores de prejuízo fiscal.
No ano passado, com base nas regras antigas, foram recuperados
aos cofres públicos R$ 31,7 bilhões - valor 29% superior ao alcançado no ano
anterior.
A transação foi instituída em fevereiro de 2020, por meio da
Lei nº 13.988. A medida foi um marco porque o Código Tributário Nacional previa
a transação, mas faltava a regulamentação por lei. O Fisco, desde então, tem
permissão para sentar à mesa e negociar com devedores, não importa o valor da
dívida.
Pela lei anterior, o limite de descontos era de 50% sobre
juros e multas. O teto passou para 65%. O limite do parcelamento também foi
estendido, passando de 84 meses para 120 meses. É possível ainda que a
transação seja aberta a partir de pedido do próprio contribuinte.
O prejuízo fiscal e a base de cálculo negativa da CSLL
poderão ser usados para quitar débitos tributários até o limite de 70% do valor
remanescente, após a aplicação dos descontos. Embora o uso deva ser autorizado
pela Receita Federal ou PGFN, tributaristas comemoram essa oportunidade.
Precatório ou direito creditório com sentença de valor
transitada em julgado - inclusive se o precatório ainda não estiver emitido -
também poderão ser usados para amortização da dívida tributária principal,
multa e juros. O tributarista André Oliveira, sócio do Castro Barros Advogados,
projeta que o contribuinte poderia pedir a revisão das transações não
individuais já firmadas para prever o uso de precatórios nos termos da nova Lei.
O que ficou de fora da nova lei, após a sanção, é a
possibilidade de incidência do desconto sobre o débito principal. Mesmo assim,
o avanço foi relevante, segundo a advogada Priscila Faricelli, sócia do
Demarest Advogados. “A Lei 13.988 tinha vindo de forma muito tímida porque
havia muita resistência ao instituto”, afirma a tributarista.
Alguns contribuintes esperavam pelo chamado “Refis da
Covid”, que seria um parcelamento especial de débitos tributários. Priscila
destaca que, diferente do Refis, na transação é feita a análise da recuperabilidade
do crédito do contribuinte. Para ela, haverá um monitoramento da procuradoria
que barrará, no momento do acordo, o contribuinte que provavelmente vai se
furtar do pagamento de tributos para tentar, constantemente, se aproveitar de
benefícios.
Para a advogada, a transação tem permitido a construção de
um canal de diálogo entre Fisco e contribuintes que há anos era esperado. Por
isso, considera as mudanças relevantes, mesmo que o desconto sobre a dívida
principal tenha sido vetado na sanção da legislação.
Até a nova norma, apenas parte dos débitos não inscritos em
dívida ativa podiam ser negociados com a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional
(PGFN). Eram os considerados de pequeno valor ou aqueles discutidos por meio de
teses do contencioso tributário. Apenas duas teses foram abertas para acordos:
a dos programas de participação nos lucros e resultados (PLR) e a do ágio.
Agora, os débitos não inscritos poderão ser negociados de forma mais ampla.
A lei ainda esclarece que descontos concedidos nas cobranças
de créditos da União e autarquias não serão tributados por Imposto de Renda,
CSLL, PIS e Cofins. “São alterações pontuais que aperfeiçoam a transação”,
segundo Fábio Calcini, sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia.
O advogado também destaca o aproveitamento de prejuízo fiscal pelas empresas em
crise financeira.
Os setores mais beneficiados serão as empresas em
recuperação judicial ou prestes a entrar em recuperação, porque têm rating
baixo e mais desconto, além de, provavelmente, prejuízo acumulado, segundo
Matheus Bueno, sócio do Bueno Tax Lawyers. “Qualquer contribuinte que acumulou
passivos na pandemia e ainda está no Carf [Conselho Administrativo de Recursos
Fiscais] pode ter vantagem”, afirma.
A norma poderá levar a PGFN e a Receita Federal a
modificarem o edital que abriu a transação para discussões judiciais e
administrativas sobre ágio, de acordo com Julio Janolio, sócio do Vinhas e
Redenschi Advogados. “Na prática, haverá perda de interesse por parte dos
contribuintes, já que a os benefícios trazidos na lei são melhores do que
aqueles previstos no edital do ágio atualmente vigente”, afirmou.
Fonte: Valor Econômico